segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Meias cheias

Hoje não te quero ver estás vazia, sabes bem que não gosto de te visitar vazia. Hoje só de pensar em entrar em ti, vazia, davam-me voltas á garganta, fui por isso errando entre as paredes da pequena Lisboa.
Andei ao encontro das tascas que, cheias, me mantinham o mais longe do teu vazio. A tua falta de tudo era o meu nada.
Mais tarde passei pelos escassos bares procurando antigas companhias, novas caras ou até mesmo aquelas para as quais é difícil parar a olhar.
Já bebido e muito esquecido, voltei para ti. Ainda que vazia eras a única que tinha o jeito de me abrigar.

Hoje não te vou querer ter, és vazia.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Teia minha

"Sinto que no fim vou ficar contigo és tudo o que eu quero, mas por agora não te posso ver nem pintado."

Foram estas as escassas palavras que se enrolaram em torno das suas orelhas e lhe aprisionaram a cabeça. A partir desse instante as longas e espessas teias foram lançadas debaixo dos pés, os movimentos, quando existiam, serviam só para o embrulhar no lençol.
Ela tinha jogado todas as cartas, ele ainda meio abananado com os abalos nas fundações parou a olhar para um palacio. Nunca se soube desenmerdar sozinho, pelo menos nunca depois de se ter deitado numa outra cama e desempacotado as meias na mesinha de cabeceira.

"...és tudo o que quero... mas põe-te nas putas." foi isto que continuou a ecoar dentro da mioleira fria e vazia.
Decidiu por alguns séculos deitar areia sobre o assunto e deixa-lo junto das conchas, não a viu, não a queria ver, ou pelo menos era isso que queria querer.

"...no fim és meu..." no fim do quê? Tudo o resto foi um recalcamento estúpido daquele dia e ele não conseguia estar com mais ninguém sem que, numa ou noutra noite, não se aconchegasse mais na teia à espera de ser comido. Ela é maior, ela é sempre maior, ou pelo menos assim o foi.

No outro dia, assaltando um canto do olho, viu-a esgueirar-se na janela de um carro, acompanhada, como é obvio, pela nova presa.

"...no fim..." percebeu.