terça-feira, 21 de junho de 2011

Nas asas d'uma mosca

Nunca conseguia manter nada organizado na sua cabeça e perdia-se varias vezes durante o dia no zumbir tosco de uma mosca. A sua casa era meticulosamente arrumada por uma empregada de limpeza à qual ele pagava com favores carnais, ela não se importava, e ele aprendera a usar-se como moeda de troca desde miúdo. No trabalho mantinha toneladas de folhas espalhadas pela secretária rodeando a maquina de escrever que disparava letras com precisão milimétrica contra o papel arremessando-o contra a parede. Não usava virgulas e os pontos finais eram escassos pois nunca sabia como acabar um texto. Quem lesse as suas paginas dava em louco ao tentar organizar as frases soltas e sem nexo, que só se compreendiam aquando de uma transfusão de cerebro. Na boate ora pedia scotch, ora bebia uma cerveja sem álcool, como de seguida vazava um bagaço velho. Nunca aprendera a fazer listas, faltou a essa classe, ou melhor na escola estar nas aulas era o mesmo que escrever nas mesas e não prestar atenção ao que era dito. Um dia perdeu-se na sua propria cidade e, sem saber onde estava, deambulou até à exaustão. Até hoje não encontrou o caminho para casa, e vai errando, perdido entre as distracções do dia-a-dia. Não sabe o proprio nome, pois perdeu a atenção nos dos outros, da sua cara já não se lembra pois um reflexo é uma dimensão paralela e indefinida, perdeu a carteira, e a noção do tempo baralha-se com o brilhar da lua e o sol.

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